Ficç?o também é Verdade

Essas s?o experiências liter?rias, comprometimento com idéias verdadeiras, nem sempre originais, que saltam da cabeça e se transformam em palavras.

 
 

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quinta-feira, dezembro 18, 2003
 
Cabelo

Comecei deitada olhando pra cima. O dia já exclamava as horas lá fora, mas eu não queria levantar da cama. Foi aí que meus cabelos começaram a ir em direção ao teto. Primeiro eles somente se arrepiaram, mas logo forçaram minha cabeça a erguer-se. Não pareciam puxões nem nada, até porque eles pareciam estar crescendo também, com vida própria de serpentes de Meduza, mas eu jamais transformaria em pedra quem fitasse os meus olhos.

Os cabelos continuaram subindo, levando aos poucos os meus pés do chão. Por algum tempo até caminhei nas pontas dos dedos, e no outro instante mal podia sentir o piso abaixo de mim. Os cabelos se espalharam pelo teto do meu quarto e pararam o ventilador. Eles eram fortes como as ondas do mar, ondas cheias de fibra sedosa cor de tronco de árvore. E eu, lá no meio do quarto, pendendo ao lado do ventilador de teto feito um lustre. Pés descalços, camisola de malha de cor clara e confortável. Ria infantilmente e sem nervoso.

Os cabelos foram rumando para a sala, e eu não podia ver, mas eles já saíam pela minha janela, crescendo como uma hera pela parede do prédio. Era divertido passar por dentro de minha casa vendo tudo do alto, eu estava pouco mais de um metro acima do chão. Chegando na sala de jantar, minha mãe tomava café ao mesmo tempo em que lia o jornal. Uma mecha puxou uma cadeira para mim e me pôs sentada à mesa. Olhando para mim e aquela massa de queratina que se já se espalhava por toda casa, minha mãe falou:

- Menina, você precisa dar um jeito nesse cabelo.

Então eu peguei a faca do pão e me dei este penteado repicado supermoderno.